sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Jornalismo- Nem Gratuito, nem Imediato, nem Superficial

Vi este texto nas páginas do ComUM mas, com a devida vénia, peço para o transcrever aqui.
A que distância estamos disto!
E que pena não haver na área da Comunicação Social da UM asas para fazer algo deste género em Portugal.
Sei que não seria fácil.
Mas será que estamos tem tempo de facilidades?
E, apesar de tudo, move-se!
Escrita por Joaquim Fidalgo (Professor do ICS)
quarta, 12 dezembro 2012 16:13
Nem gratuito, nem imediato, nem superficial – eis o que, neste avançadíssimo ano da graça de 2012, e neste tempo de nets, onlines, redes, tablets, iPads e que tais, um ilustre jornalista entende que o jornalismo NÃO deve ser. Nem gratuito, nem imediato, nem superficial. Ou seja, tudo ao contrário do que parece ser moda.

O ilustre jornalista chama-se Edwy Plenel, é francês e é mesmo ilustre: trabalhou durante mais de 20 anos no conceituado Le Monde, tendo chegado a diretor da sua redação. E agora, mais precisamente desde 2008, é diretor de um jornal online chamado Mediapart.fr. Para jornalista ilustre, convém que Edwy Plenel seja também coerente, e parece que o é: o jornal que dirige não é dado de graça, só "sai" três vezes por dia (apesar de ser online) e preocupa-se sobretudo em aprofundar, interpretar e investigar os assuntos da atualidade.

O mais interessante da história é que, pelos vistos, a experiência inovadora está a correr bastante bem e até já dá (imagine-se...) algum lucro. Não perder dinheiro já seria ótimo, mas não se fica por aí. Teve, em 2011, um resultado positivo de 570 mil euros e este ano conta ter tanto ou mais. "Demonstrámos que o jornalismo de investigação pode ser rentável. Podemos resistir ao temporal", disse Plenel, recentemente numa mini-entrevista ao El Pais.

Cada assinante do Mediapart.fr paga, por mês, nove euros. Não é muito, tratando-se de um jornal que sai três vezes por dia... Claro que é um pouco mais caro do que muita da informação que pode consultar-se via Internet (tanta dela gratuita). Mas, por agora, há já umas 60 mil pessoas que acham que vale a pena pagar esse montante para ter acesso ao jornal. E com isso ajudam a pagar o salário dos 30 jornalistas que o Mediapart.fr emprega. Sim, que para haver informação de jeito é necessário haver profissionais de jeito – e um profissional de jeito merece receber um salário adequado pelo serviço que presta. Como, além disso, este jornal decidiu não ter publicidade (convenhamos que é interessante estar a ler uma notícia num jornal online e não ver de repente abrir-se um banner qualquer a vender um carro ou umas pastilhas...), é apenas o dinheiro dos leitores que permite rentabilizar o projeto.

As três edições do jornal são publicadas às 9h00, às 13h00 e às 19h00 de cada dia. Ou seja, não há um fluxo contínuo de notícias, como é típico da informação online (e como é próprio das chamadas breaking news). Como o Mediapart.fr privilegia a interpretação dos factos, a reflexão, o enquadramento, a investigação, entende-se que precise de algum tempo para o fazer. Não é o "publique-se já e confirme-se depois" que se gasta lá na casa. E para breaking news já há muito canal disponível por aí.

Ou seja, é hoje muito fácil sabermos no imediato, através da(s) rede(s), que caiu um prédio na avenida, que a terra tremeu em Xangai ou que Miguel Relvas foi novamente a Angola. Como diria um amigo meu, isso são apenas "notícias", isso não é "informação". Transformar as "notícias" em "informação" (e em conhecimento) é ir para além delas, é verificar, enquadrar, contextualizar, explicar, ajudar a perceber o sentido que por ali anda mais ou menos oculto. E isso, de facto, não é uma coisa barata de fazer. E não é uma coisa que se possa fazer em segundos. E é tudo menos uma coisa superficial. Ou seja, um projeto como o Mediapart.fr tem toda a razão em não querer (não poder) ser nem gratuito, nem imediato, nem superficial.

Mas, para poder ser o que é e continuar sendo, sem correr o risco de fechar, é preciso que a outra parte – nós – faça o que lhe compete. Se achamos que uma informação jornalística de qualidade, séria e independente, é algo de muito importante para as nossas vidas e para as nossas sociedades, temos de estar dispostos a pagar por ela. De outro modo...

P.S.: Edwy Plenel esteve em Espanha a apadrinhar o nascimento de um projeto jornalístico semelhante ao Mediapart.fr, chamado Infolibre. Será que estas (boas) ideias vão arranjando pés para andar e aparecendo cada vez mais por aí? Ou, quem sabe, por aqui?...