quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

CG-Eleições 2013 - Serviço Público, Autonomia e Responsabilidade das Universidades

As linhas que seguem são meros tópicos de um tema que daria para muitas páginas e para muito debate. Ficaremos só pelos tópicos.

Falamos muito da autonomia das universidades públicas mas esquecemos algumas coisas igualmente importantes. Desde logo que as universidades são, antes de mais, serviços públicos, ou seja, organizações do Estado que têm como finalidade a investigação e a docência a nível superior.

A autonomia vem depois. Ou seja, a autonomia das universidades é instrumental, é um meio para cumprir melhor a sua finalidade.

Deixamos aqui de lado a análise de vários aspectos da autonomia universitária (estatutária, científica, pedagógica, administrativa e financeira) para nos centrarmos na autonomia de governo, que se manifesta na escolha de órgãos representativos (actualmente o conselho geral e o  reitor).

Poderia pensar-se que estamos aqui, sem mais, numa autonomia semelhante àquela que gozam as autarquias locais ou as ordens profissionais mas não é assim. A autonomia das universidades não é a mesma, por exemplo, que a autonomia dos municípios.

O que distingue não é tanto o exercício da autonomia (aqui há muitas semelhanças) como o fundamento. O que separa as duas formas de autonomia é a diferente qualidade que possuem os membros respectivos.

Os municípios são entidades que pertencem aos cidadãos que nelas residem e, por isso, estes têm o direito de governar o seu município, escolhendo os titulares dos órgãos deliberativo (assembleia municipal) e executivo (câmara municipal com o seu presidente). Estes órgãos, por sua vez, respondem perante os munícipes que representam.

Já quanto às universidades as pessoas que dela fazem parte, alunos, funcionários e docentes ( a comunidade universitária) não são donos delas. São seus servidores (no caso dos alunos mais até utlizadores) . As universidades públicas pertencem ao povo português que, através dos órgãos que os representam, as criou e mantém.
A autonomia das universidades não é, portanto,  um direito dos membros da academia mas é um dever. Pode parecer estranho que se fale assim, em dever de autonomia, em vez de direito à autonomia. A estranheza desaparecerá se tivermos em conta que se as universidades não tivessem autonomia, nos seus vários aspetos, estariam dependentes. Dependentes do Estado-Administração, ou seja, do Governo que é o “órgão superior da administração pública”. O Governo teria, então, a última palavra, a palavra decisiva sobre o que se ensina e investiga e naturalmente sobre o que não se ensina nem investiga. Para isso, eliminada que fosse a autonomia, utilizaria o poder que nessas circunstâncias possuiria para dirigir a universidade, dificilmente resistindo à tentação de a controlar em planos tão essenciais como os da liberdade de ensinar e de investigar. É para evitar esse perigo que a Constituição e a Lei consagram a autonomia universitária.

Mas não se pense que nesta matéria as universidades têm o direito de fazer o que bem lhes apetece. De nenhum modo. As universidades devem agir dentro de uma política de ensino superior cuidadosamente elaborada para o país e que conste de uma lei devidamente aprovada pela Assembleia da República, procurando atingir do melhor modo as metas nela definidas.

E estamos agora em condições de voltar ao princípio e dizer que, com a ajuda da autonomia, o essencial de uma universidade é investigar e ensinar com qualidade.  Neste aspeto, não é a autonomia que conta são os resultados e as universidades têm de prestar contas do que fazem.

A quem? Seguramente e desde logo à academia, pois foi esta quem elegeu os seus órgãos. Mas não basta de nenhum modo responder perante a academia pela razão que acima referimos ( a  academia não é dona da Universidade). É antes perante o povo português que esta tem de prestar contas.

Mas de que forma?

Esta matéria da responsabilidade das universidades, perante o povo português de uma forma séria e não demagógica,  ainda não está devidamente regulada entre nós e deveria estar.

Muitas coisas teriam de mudar, desde já, na organização e funcionamento das universidades…

Alguém quererá agarrar este assunto nas eleições que se avizinham?

Braga, 27 de Dezembro de 2012
António Cândido de Oliveira