Crítica e silêncio, em regra, opõem-se. Embora, em certos e muito precisos contextos, o silêncio possa constituir uma forte crítica, esta exprime-se exatamente contra o silêncio. Em vez de calar (ou manifestar apenas num círculo privado a sua opinião), alguém tem a coragem de criticar publicamente.
A coragem é precisa, pois quem critica sujeita-se a ser criticado e a sofrer consequências por causa dessa sua atitude. Coragem tanto maior quando o autor indica factos concretos e autores, não se ficando, pois, por afirmações que poderemos afirmar constituir uma crítica ligeira (suave).
Se alguém diz ou escreve, por mero exemplo, que alguém usou o seu alto cargo público para favorecer despudoradamente pessoa amiga, prejudicando outras, ou que o processo eleitoral numa determinada organização , apesar de ser formalmente democrático esteve longe de ser realmente democrático, ou ainda que determinada medida foi mal tomada e prejudicou a instituição ou a comunidade dela destinatária faz uma crítica suave. Uma crítica que, por vezes, só pode ser entendida por quem se revê nessa crítica. Esta é para mim, dirá, em silêncio, quem, porventura, se considerar visado.
Esta transformar-se-á numa crítica forte e direta se o autor mencionar factos concretos e nome dos autores, correndo nesse caso o risco de ser ainda mais criticado e de sofrer consequências mais severas. Essas consequências num Estado de direito democrático nem são tanto as judiciais, pois os tribunais sabem distinguir a liberdade de crítica do abuso dessa liberdade e garantem, ao mesmo tempo, a liberdade de expressão consagrada na Constituição vigente.
As consequências mais prejudiciais são as que utiliza o titular (ou titulares) do poder criticado, assumindo atitudes em relação às quais é difícil a defesa. É muito frequente a atitude de quem, exercendo o poder, não reage de imediato perante a crítica, mas espera o momento oportuno para atingir quem ousou falar. Quem me lê, sabe como é fértil a imaginação de quem usa o poder para esse fim.
Por isso, é muito comum, infelizmente, o silêncio de quem podia e devia criticar. O raciocínio é simples: se eu não critico (e até aplaudo) sou bem visto e tenho o caminho mais aberto para conseguir o que pretendo. Se falo, só vou arranjar problemas. Dizia, mais ou menos isto, um humorista português bem conhecido pelos mais velhos: “ a minha política é o trabalho e não me tenho dado nada mal com isso”.
É essa uma atitude muito própria de há mais de 40 anos, mas passado esse tempo, já é de desejar - e mesmo exigir - cidadãos ativos que sejam capazes de aplaudir quando for o caso (coisa fácil), mas de criticar quando a crítica, a seu ver, se impõe (algo muito mais difícil).
Criticar, faz parte da educação para a cidadania que tão precisa é.
in Diário do Minho