Dirijo-me aos novos estudantes, que estão a chegar à Universidade
(mais de 2.500), num clima de paz e de acolhimento, passando a fazer parte de
uma academia de mais de cerca de 20.000 pessoas, não podendo deixar de os interpelar.
Estejam à altura do que a geração dos vossos pais e avós conseguiu
para o nosso país nas últimas décadas: pôr ao vosso alcance o ensino superior,
ainda que de acordo naturalmente com a capacidade e o trabalho de cada um.
Lembro-vos que, ao entrar na Universidade, nos anos sessenta, existiam
universidades apenas em Coimbra, Lisboa e Porto e a entrada na Universidade era
um privilégio para muito poucos (e um esforço enorme para muitos pais e
familiares). Vila Nova de Famalicão, por exemplo, não tinha uma escola pública
(liceu) e a escola privada (paga), que existia, dava formação que não chegava
para entrar no ensino superior, sendo preciso fazer mais dois anos de estudo
fora do concelho.
Acesso à Universidade, naquele tempo, significava com grande
probabilidade emprego e emprego qualificado e hoje tal não sucede por razões
várias a principal das quais tem a ver com o modo como está organizada a
sociedade.
É para esse desafio (o da melhor organização da sociedade) que venho
chamar-vos hoje. É minha convicção que o nosso grande problema não é a produção
(vejam como pululam e estão cheias as prateleiras de hipermercados e
superfícies comerciais – Continente, Leclerq, Lidl, Pingo Doce e tantas outras)
é a distribuição mais igualitária.
Precisamos de uma sociedade mais justa e equilibrada e não de um
crescimento sem regras, onde conta mais a quantidade dos bens do que a sua
qualidade. Produz-se e incentiva-se a produzir para bem do PIB tanta coisa
desnecessária e mesmo prejudicial. Para quê? Produzir é preciso, mas produzir o
que é necessário e não aquilo que acabamos por deitar fora.
É provável que nem todos estejam de acordo com o que acabo de
escrever. Mas então segue outra interpelação: debatam e discutam. Formem uma
opinião fundamentada. Sejam universitários! Antes de futuros engenheiros, sociólogos,
médicos, juristas, arquitetos, jornalistas, músicos, economistas, gestores,
geólogos, historiadores, filósofos e outras profissões e ramos do saber lembrem-se
de que são cidadãos. E como cidadãos pensem!
A primeira coisa que se vos pede é que sejam cultos e fraternos e,
sendo cultos e fraternos, tudo o resto virá por acréscimo.
Terão consciência dos vossos direitos e dos vossos deveres e não
deixarão de os exercer de um modo justo. Comecem a trabalhar, desde já, para
deixarem às gerações futuras uma sociedade melhor do que aquela que receberam.
E não se deixem enredar em coisas mesquinhas! Abram os olhos!
P.S. – Há tanto para vos dizer que um artigo de jornal não chega.
Espero escrever-vos algo mais extenso.
A primeira coisa que se vos pede é que sejam cultos e fraternos e,
sendo cultos e fraternos, tudo o resto virá por acréscimo.
António Cândido de Oliveira, in Diário do Minho